Você sabia que, legalmente, alguns cidadãos simplesmente não existem no Brasil? São pessoas que nunca tiveram uma certidão de nascimento e, com isso, também não têm RG, CPF, Carteira de Trabalho e acesso aos serviços de saúde, educação e previdência. De acordo com dados de 2015 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 3 milhões de pessoas viviam nessa situação no país. No ano de 2017, estima-se que a cada 100 nascimentos, aproximadamente três não foram registrados no primeiro ano. Para alertar sobre o assunto e auxiliar na diminuição do sub-registro, a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS) lançou a campanha “Existência Digna”.
O objetivo é viabilizar o chamado registro tardio, que é aquele feito após o prazo legal. Conforme a Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/1973), quando uma pessoa nasce, o registro deve ser feito no lugar onde ocorreu o nascimento ou no lugar de residência dos pais, em até 15 dias após o parto, ou, se o local for distante mais de 30 quilômetros da sede do cartório, em até três meses. A primeira via da certidão de nascimento é gratuita.
Na maioria dos casos, será necessário ingressar na justiça para solicitar o registro tardio de nascimento. Em Porto Alegre, os interessados podem procurar a Defensoria Pública pelo telefone (51) 3225-0777 ou presencialmente, na Rua Sete de Setembro, 666, Centro Histórico. No interior, o contato pode ser feito pelo e-mail [email protected].
O primeiro atendimento será feito por psicóloga ou assistente social da DPE, que posteriormente fará os encaminhamentos necessários. Entre eles está uma busca em diversos órgãos, para identificar se a pessoa já tem algum documento ou se existe registro de seus pais. Na ação, o defensor público explica as circunstâncias e pede à justiça que o cartório emita a certidão para o indivíduo.
De acordo com a defensora pública Marta Beatriz Todesco Zanchi, entre os cidadãos que necessitam do registro tardio estão as pessoas em situação de rua, aquelas com transtorno mental e que estão acolhidas em alguma instituição e filhos de mulheres que estão abrigadas por sofrerem violência doméstica e sexual. “Nós não conseguimos saber a dimensão disso. A digitalização dos cartórios é recente, então é difícil ter uma noção de quanta gente está nessa situação. Já atendemos desde crianças de cinco anos até idosos com mais de 60 anos sem registro. Como defensora pública, nunca imaginei que essa demanda existisse em número tão grande”, disse.
Conforme Marta, após a busca pelos documentos do indivíduo, o processo costuma ser ágil, pois o Judiciário é acessível a esses pedidos e entende a importância do registro civil para a cidadania. “Atendemos o caso de um senhor que estava acolhido em um lar e faleceu meses após conseguir sua primeira certidão de nascimento. Graças a isso, ele não foi enterrado como indigente. Dar uma existência digna às pessoas e garantir seu direito ao registro civil é uma das nossas missões enquanto Defensoria Pública”.
Ajudaram na construção do projeto, também, o defensor público Marcelo Dadalt, a assistente social da DPE Thais Dalla Rosa e as psicólogas Cristina Schwarz e Leticia Souza Mello.