Quando pensamos em sustentabilidade é importante ter consciência de que se trata de um conceito bastante amplo e, por isso mesmo, envolve todas as áreas da nossa vida. A busca pelo equilíbrio no convívio com a natureza deve fazer parte do nosso estilo de vida, o que envolve estar sempre atento ao impacto que as nossas escolhas possuem não só na nossa vida, mas também na vida daqueles que estão ao nosso redor. Quando vamos às compras não é diferente, além do preço e qualidade, devemos nos perguntar como aquele produto chegou até a prateleira, afinal você compraria um produto barato, mesmo sabendo que ele foi produzido em condições desumanas de trabalho? e se ele fosse produzido a partir da extração ilegal de recursos naturais? É a partir dessa ideia que nasceu o conceito de “fair trade” ou comércio justo, um modelo de comércio pautado na ética e que considera os aspectos sociais e ambientais no relacionamento entre o produtor e o consumidor.
Essa nova forma de enxergar as relações de comércio é considerada um movimento social global em prol da sustentabilidade, pois promove o encontro entre produtores responsáveis e consumidores conscientes e incentiva métodos de produção sustentáveis através da aplicação de boas práticas ambientais. O principal objetivo do movimento é garantir que pequenos produtores possam disponibilizar os seus produtos de forma mais direta no mercado, eliminando os atravessadores e possibilitando ao consumidor conhecer a origem do que consome. Essa aproximação, além de incentivar a agricultura familiar e os pequenos negócios, também favorece a melhoria das condições de vida dos trabalhadores rurais, agricultores e artesãos que, apesar de serem os principais responsáveis pela disponibilidade dos produtos que consumimos, frequentemente não recebem uma remuneração justa e condizente com o seu trabalho.
Você pode achar que a escravidão é uma injustiça que ficou no passado, mas infelizmente essa ainda é a realidade de muitos adultos e crianças aqui no Brasil e no mundo. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), estima-se que mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo ainda são vítimas da chamada escravidão moderna e o agronegócio está entre os setores da economia que mais recruta pessoas para trabalhar em regime semelhante ao da escravidão, fazendo uso de práticas trabalhistas indignas e coercitivas. O cacau, a principal matéria prima do chocolate, produto tão adorado e consumido diariamente por nós, está entre os cultivos mais preocupantes. Grandes multinacionais já foram investigadas por conta de denúncias de trabalho infantil e exploração de mão de obra. Esse tipo de situação nos mostra o quanto a falta de informação ainda é um dos maiores inimigos dos consumidores conscientes.
No entanto, é importante não confundir esse modelo de comércio com a caridade, o comércio justo é uma alternativa acessível e simples de fazer negócios e que traz benefícios para todos os envolvidos. Produtores, comerciantes e consumidores passam a formar uma rede de parceria e os interesses de cada um são considerados e respeitados. Nos últimos anos, com o aumento do debate sobre o futuro do planeta, cresceram também as iniciativas que buscam mudar os padrões de consumo da sociedade. Atualmente, existem iniciativas de rotulagem, selos e certificações de fair trade lideradas por diversas organizações em diferentes países e que impulsionam grandes marcas a aderirem ao movimento e priorizarem uma cadeia produtiva mais justa e com menos impacto no meio ambiente. Essas iniciativas são válidas e podem trazer resultados no longo prazo, mas vale lembrar que cabe a nós, consumidores, exercermos o poder de escolha com responsabilidade, pois se os nossos desejos e necessidades definem o que deve ser produzido, podemos definir também como deve ser produzido.
Na sua próxima ida às compras, considere trocar o hipermercado pela feira livre ou pelo comércio local, substituir a fruta importada pela que é plantada na sua região, dar preferência aos produtos artesanais ou produzidos em cooperativas, empreendimentos solidários ou familiares. Incorpore também o hábito de ler rótulos e procure saber mais sobre aquela marca que você adora. O fortalecimento do comércio justo como alternativa sustentável não pode ser uma responsabilidade exclusiva do Governo e da indústria, toda grande mudança começa no âmbito individual. Somos nós, consumidores, que como num efeito formiguinha, acabamos por forçar a mudança de padrões.
Autor: Fernanda dos Santos Jorge Gestora do Terceiro Setor. Doutoranda em Tecnologia, Inovação e Sustentabilidade (PPGA-UFRGS).